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Lista Tormenta - Possessão

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Mensagem por Leishmaniose Seg Fev 14, 2011 2:13 am

Olá,

Devido ao sucesso e repercussão obtido no Crônicas Artonianas I, o Efreetales uns meses depois - acho que foi um ano, mas não lembro com precisão - realizou um segundo concurso, onde dez contos seriam escolhidos para participar do Crônicas Artonianas II.

Com um pouco mais de experiência, eu escrevi então esse conto que chamei de Possessão. Ao contrário do Cristal de Tenebra, eu procurei explicar um pouco mais as coisas, para que pessoas que não conheciam Tormenta ou um sistema de RPG pudessem compreender melhor o conto. Lembro que na época eu o dei para que outras pessoas lessem, e apesar de leigas sobre o cenário, conseguiram compreender o suficiente para que o conto fosse entendido - apesar que certas pegadas como o "Aconteceu em Petrynia" e outras sacadas, só o pessoal que conhece o cenário poderia pegar.

Foi o primeiro conto que tentei ousar também um pouco mais, criando coisas próprias pra ambientação do conto, como motes e até medidas e pesos diferentes do tradicional. Eu até comecei o segundo conto, que explicaria mais e se aprofundaria na trama, mas nunca o terminei, assim como a continuação do Cristal de Tenebra e de 300 contos não-terminados - ê lelê... -. Abaixo coloco a terminologia que será utilizada ao longo do conto que foi criada por mim e não têm referência ao algo do cenário (O "Aconteceu em Petrynia", por exemplo, tem... É o "Era uma vez" de Arton).

Glossário escreveu:1. Estações: medida de tempo equivalente a anos;
2. Pedras: medida de peso equivalente a quilos;
3. Galhos: medida de comprimento equivalente a Metros;
4. Ampulhetas: medida de tempo, onde as douradas indicam horas, as prateadas, minutos e as de bronze, segundos;
5. Ritmo de Lena: equivalente às pulsações;
6. Marah fizera morada em seu coração: estava em paz, tranqüilo.

Bonanças.

Atenciosamente,
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Mensagem por Leishmaniose Seg Fev 14, 2011 2:21 am



Aconteceu em Petrynia, no pequenino vilarejo de Kizna no norte do reino. Era verão e o manto negro de Tenebra já havia caído em Arton. Iluminando o local, apenas o “Sorriso de Tenebra”, como é conhecida a fase da lua crescente em muitos reinos. Já viram que em algumas épocas do ano, em vez de surgir verticalmente, a lua crescente surge horizontalmente formando um sorriso? Muitos gostam disso, pois acreditam que a deusa esteja de bom-humor. Era uma noite fria, devido às correntes de vento vindas das Montanhas Uivantes. O vilarejo de Kizna tinha somente uma taverna, mantida pelo burgomestre da cidade, Anderson Foca.

Era um homem pacato, o velho Foca. Contam que ele já foi aventureiro, embora as línguas de Sszzaas costumem dizer que a maior aventura de Foca foi lutar com um bom pedaço de gorad. Mas isso não vem ao caso... A taverna do Foca, como era conhecida, proporcionava alguma diversão aos cansados fazendeiros após um dia exaustivo no campo. Pra muitos, isso era o suficiente. Mas como todo caso tem exceção, a exceção maior encontrava-se na pessoa de Kendall Fauno.

Kendall Fauno era um jovem adolescente com 18 estações[1]. Era um pouco alto, possuindo cerca de 75 pedras[2] de peso distribuídas em 1,75 galhos[3] de altura. Tinha os olhos castanhos escuros, a pele parda e os cabelos negros. Seu sonho era tornar-se um aventureiro viajante em Arton, conhecer a grande cidade de Valkaria, comprar armas em Zakharov e nadar nos mares de Khubar. Locais que ele conhecera através das narrativas de seu avô, que fora um aventureiro em sua juventude. De seu avô, além do espírito viajante, ele herdou um bastão feito de Tollon puro. Bastão esse que o acompanhava durante suas peregrinações na floresta que cercava Kizna no leste e no norte, a Floresta conhecida como Arbóreas. Às portas da morte, seu avô o fizera prometer que ficaria na cidade até que alguém viesse para substitui-lo. Mesmo sem entender o motivo do pedido, Kendall cumpria a promessa feita. E, por isso, não abandonava aquele vilarejo que tanto o entediava, por aparentar tanta tranqüilidade quanto o reino de Hershey.

Naquela fria noite, Kendall fitava as estrelas tentando, novamente, entender a promessa que seu avô pedira. Estava encostado a uma estátua de Cyrandur Wallas, o grande herói de Petrynia. Mantinha seu inseparável bastão preso às costas por uma corda de tecido. Estava entediado. Seu amigo Khalil o convencera a ir essa noite à taverna, onde um viajante narrava histórias recentes do Reinado. Boatos do avanço da Tormenta, uma tempestade rubra e demoníaca que dizem surgir do nada e ser pior que a Aliança Negra, no leste do Reinado e a tomada de Khalifor pelo exército de goblinóides da selvagem Lamnor. Kendall não queria saber o que ocorria lá fora, ele queria estar lá. E ouvir essas histórias poderia inquietar mais ainda o seu espírito, aumentando seu sofrimento interior. Mas Khalil conseguira convence-lo a ir essa noite. Silenciosamente, um vulto começou a aproximar-se por trás da estátua de Cyrandur. Seu andar era furtivo e silencioso, como o de um visitante da noite.

— Boa noite para você também, Khalil. — proferiu Kendall com grande serenidade. — Está atrasado. Muito atrasado mesmo.

— Pra quem não queria vir, até que você reclama demais.

Khalil aproximou-se olhando para as árvores existentes na praça Wallas. Era um pouco mais baixo que Kendall, umas 10 folhas e devia pesar a mesma quantidade de pedras[2]. Ao contrário de Kendall, Khalil tinha os olhos castanho-claros e cabelos de mesma cor, sendo sua pele branca. Trazia preso às suas costas um pequeno bandolim, caso precisasse dele na taverna. Ao contrário de muitos que andam à noite, Khalil não trazia armas, pois aprendera o Kharpo com um khubariano viajante. Um estilo de luta com mãos nuas, utilizando apenas movimentos das mãos e das pernas, combinados com gestos acrobáticos. É bastante difundido na ilha de Khubar. Kendall olhou para Khalil com um olhar irônico, devido ao comentário do mesmo.

— Então, vamos indo. — falou Khalil.

Kendall apenas olhou para Khalil e começou a caminhar em direção à taverna, que ficava a exatas três ampulhetas prateadas4. Quando se aproximavam da taverna, uma jovem mulher saia da mesma. Era Marlu, a cozinheira da taverna. Vendo os dois jovens aproximando-se, ela cumprimentou:

— Boa noite, jovens.

— Boa noite, Marlu. — respondeu Khalil com um sorriso cordial. Kendall acenou com a cabeça.

— Viram as senhoritas Veroni e Marceli?

— Não, não tivemos essa felicidade. — respondeu Khalil.

— Elas não estão na taverna? — perguntou Kendall, intrigado.

— Não, não. Eu fui lá em cima, no quarto delas, mas as camas estavam completamente vazias... Por Marah! Tomara que não tenham ido encontrar o Cyrandur Wallace. Ele estava esquisito, sabem. Rondou as duas a tarde todinha, junto com aquele grupo dele.

— O Cyrandur Wallace? — murmurou Kendall involuntariamente.

— Exato. Sabe, embora tenha um nome derivado do grande Cyrandur Wallas, ele não age de acordo com o nome. Agora, vou ter que procura-las, antes que o pai note a falta das duas... Já até imagino a confusão. Que Marah reine nessa taverna, caso o senhor Foca descubra a ausência das duas. — disse Marlu, apresentando nervosismo ao esfregar as mãos no avental.

— Não, se preocupe, senhora. Eu e Khalil as encontraremos. — falou Kendall.

Marlu permaneceu surpresa, não disfarçando a surpresa por ouvir aquilo de Kendall. Afinal, ele não era de conversas como Khalil. Aliás, muitos se perguntavam o motivo de duas pessoas opostas, fisicamente e na personalidade, andarem juntas.

— É que meu amigo não quer que nada de mal aconteça a Veroni e a Marceli. E nós dois poderíamos vasculhar o vilarejo mais rápido que a senhora. E ficaríamos bastante contentes em prestar esse serviço à senhora, que sempre é tão bondosa conosco. — adiantou-se Khalil, ocultando a surpresa presente nele também.

— Então, está bem. Khalil e... Kendall, confio em vocês. Por favor, tragam as senhoritas Marini de volta, sãs e salvas. E que Marah esteja com vocês.

— O mesmo, senhora Marlu. — respondeu Khalil com seu sorriso habitual.

Marlu entrou de volta na taverna. Podia-se ouvir uma música tocando e muitas risadas. Khalil voltou-se para Kendall, surpreso e perguntou:

— O que deu em você?

— Como assim? — retrucou Kendall.

— Esse tipo de coisa não é natural em você. — falou Khalil. — Se oferecer prontamente a resolver as coisas, ainda mais em aberto. Digo, você costuma fazer algumas coisas em prol da vila, mas nunca revela que foi o autor. Todo mundo pensa que o espírito de Cyrandur Wallas habita a região por causa desse seu segredo à moda Swachbuckler.

— Não temos muito tempo, Khalil. Se minhas suspeitas se confirmarem, o reinado de Marah não reinará na taverna do Foca. — Kendall começou a caminhar rápido em direção ao leste da praça.

— Você está sabendo de algo que eu não sei? — perguntou Khalil intrigado, acompanhando-o.

— Do que Wallace mais se gaba atualmente? — perguntou Kendall, esperando que o amigo chegasse à mesma conclusão.

— Ora, de ir freqüentemente à Seppet. E o que isso tem a ver com... — Khalil parou subitamente ao fitar o olhar de Kendall, exclamando logo em seguida. — Por Tanna-toh! Kendall, se eles foram às ruínas de Seppet, vai haver muita confusão...

Antes da fundação de Kizna, havia na região um castelo habitado por um tirano, cujo nome deu-se ao seu castelo e hoje, às ruínas do mesmo. Seppet. Um grupo de cinco aventureiros conseguiu pôr fim ao domínio do tirano. Três deles estabeleceram-se na região, sendo um deles, o avô de Kendall. Os outros dois partiram de volta a Valkaria, por um motivo ignorado até os dias atuais. Seppet tornou-se apenas ruínas com o passar das estações[1]. Um local temido pelos mais velhos e alvo de chacotas por parte de alguns dos mais jovens, como Wallace. Kendall desconhecia o que havia no castelo, mas estava intimamente ligado ao fato de seu avô ter ficado na cidade e com a promessa que seu avô pedira. Isso era um fato. O fato de Seppet ser perigosa e não um local para jovens adolescentes foi o que impulsionara Kendall a agir.

— O rastro deles segue para a estrada antiga, como eu previra. — falou Kendall, levantando-se após analisar os rastros existentes na saída do vilarejo.

— Droga! O que é que Wallace tem na cabeça? Dejetos de trobo? Levando aquelas duas garotas para Seppet a essa ampulheta da noite! Se algo acontecer a elas... — Khalil começava a acompanhar Kendall na caminhada em direção a Arbóreas.

Khalil era um dos poucos bardos de Arton que não flertava com jovens garotas, pois seu coração já estava entregue a jovem Marceli Marini. E só em imaginar ela sozinha com o Wallace e sua turma em Seppet, sentia uma grande angústia, que o impulsionava cada vez mais rápido entre as árvores de Arbóreas. Kendall também possuía um motivo, além da promessa feita ao seu avô. Veroni, a única pessoa que sempre o tratava bem, mesmo sabendo que ele era sisudo e pouco sociável. Ele resolvera demonstrar sua gratidão, de certa forma, protegendo-a. Mesmo acreditando que nunca teria o amor dela, não se importava... O bem-estar e felicidade dela já bastavam o sacrifício. Por isso, os dois jovens corriam tão velozmente pela floresta, em direção às abandonadas ruínas.

Não acenderam tochas para não chamarem atenções indesejadas de algum grupo de ladrões ou orcs. A luz da lua entre as folhas iluminava o suficiente até chegarem à antiga estrada, utilizada antigamente pelo Barão de Seppet. Na antiga estrada, puderam manter velocidade constante, sem arriscar-se a bater de frente com uma árvore. O silêncio entre os dois falava por si só. Nem mesmo Khalil conseguia esconder o ar de preocupação de sua face.

A aproximação de um vulto correndo de forma desajeitada mais à frente fez os dois pararem de forma brusca, mal dando tempo de Kendall puxar o bastão para um possível ataque surpresa pelos flancos. O vulto corria desajeitadamente, caindo e tropeçando bastante. Poderia ser um truque de algum grupo de ladinos, que poderiam estar cercando os dois naquele exato momento. O vulto aparentava um certo desespero ao correr, mas podia ser só fingimento. Mas, ao ver aquelas duas pessoas paradas em frente à estrada antiga, ele tentou parar e correr pra dentro da mata. Um escorregão o levou ao chão, numa queda feia. Pode-se ouvir um estalo ecoar entre as árvores. Ele quebrara algo, certamente. Kendall e Khalil colocaram-se em prontidão, aproximando-se do vulto caído. Ele agitava as mãos, golpeando o ar, enquanto ofegava.

— Não vão me pegar... (arf! arf!) criaturas de Sombria! (arf! arf!) Nunca!

— É o Ronald... — falou Khalil aproximando-se.

— Graças a Lena! (arf! arf!) Khalil... (arf! arf!) é você?! (arf! arf!) matou-me de susto! (arf! arf!) eu pensei que... (arf! arf!) que eram servos daquela... (arf! arf!) daquela... (arf! arf!) daquela coisa maldita! (arf! arf!) Obrigado, Lena! (arf! arf!) Obrigado, Lena! — disse Ronald.

— O que houve, Gargul? — perguntou Kendall, com um forte receio.

— Ranger... (arf! arf!) Você... (arf! arf!) você também está aqui? (arf! arf!) Ótimo! (arf! arf!) Quantos mais estão? Quantos mais... (arf! arf!) Quantos mais vieram com vocês? Têm que... (arf! arf!) destruí-la! — bradou Ronald, tentando levantar-se para olhar ao redor.

— Fique quieto aí Ronald! Você quebrou uma costela... — falou Khalil.

— Só estamos eu e Khalil, Gargul. Ninguém mais. O que houve? Onde estão os outros? — perguntou Kendall.

— Eu... (arf! arf!) não quis esperar... (arf! arf!) Eu sabia que... (arf! arf!) o Wallace estava... (arf! arf!) estranho. Foi... (arf! arf!) Foi aquela coisa! Ela controlou o Wallace... (arf! arf!) Para nos levar lá! (arf! arf!) Para levar as meninas lá... (arf! arf!), (arf! arf!).

— Pegue isso, Gargul! — falou Kendall pegando um comprido galho de árvore do chão. — Vai servir como bengala. Vá para a cidade e traga ajuda!

— Está... (arf! arf!) bem! — falou Ronald levantando-se com a ajuda de Khalil e apoiando-se na improvisada bengala. — Tomem... (arf! arf!) cuidado e que Nimb role bons dados para vocês...

Os dois nem esperaram Ronald começar a caminhar em direção a Kizna, estando eles já distantes quando este proferiu a última frase. O que antes era uma situação de tensão tinha tornado-se uma situação de emergência. Ronald Gargul não era de fugir de uma briga e sempre era o mais valente do grupo, nunca tendo sido visto em pânico, antes daquela noite. E isso agravara visivelmente a situação, no parecer de Kendall e Khalil. Em pouco menos de cinco ampulhetas prateadas[4], os dois cruzaram o portal de entrada das ruínas de Seppet. O castelo se encontrava mais à frente, distante e imponente no alto do morro. O que restou de suas torres podiam ser vistos sobre as copas das retorcidas árvores. Os dois jovens aventureiros iam prosseguir subindo o morro, quando ouviram o que parecia ser um grito. Entreolhando-se, os dois pararam.

— Era o Gary... — falou Khalil.

— Veio da direita! — completou Kendall.

Mal pararam e retornaram a correr entre as árvores, numerosas naquela parte de Seppet. Pararam em frente a um muro de mármore, sujo, com visgos e trepadeiras. Um portão duplo estava na entrada, com uma metade do portão no chão e a outra empenada, ainda presa ao muro por seus ferrolhos. Do outro lado do muro, podia-se ver um templo, também já em ruínas, mas identificava bem a função daquela área. Um cemitério com um templo consagrado a Tenebra. Tenebroso em qualquer situação, ele era muito mais no meio da noite, quando a lua estava no alto do céu.

— Sagrado Unicórnio de Allihanna! — exclamou Kendall.

— Será que o vento não criou uma ilusão? — perguntou Khalil, receoso.

Uma pancada no muro, fazendo-o balançar, seguido de um abafado som, confirmou o receio dos jovens. Como se fosse um sinal para adiantarem-se, os dois entraram no cemitério. Ao atravessarem o portão, algo passou por eles voando. Parecia ser um corpo humano. Era um garoto. Um garoto robusto e alto, bastante parecido com Ronald Gargul. Khalil e Kendall reconheceram logo Gary Bugbear, que se chocou contra o muro do lado norte, caindo no chão. Um vento frio circulava no local, como um fraco furacão. A fim de procurarem o que tinha atirado aquele robusto rapaz, que deveria pesar mais de 98 pedras², os dois voltaram-se à direção sul do cemitério. De onde Bugbear tinha vindo. Estavam prontos para um combate, prontos até mesmo para enfrentar um dragão, como o faria qualquer ser cuja juventude corresse nas veias. Mas não estavam prontos para presenciar aquela cena...

Mais adiante, a mais velha das irmãs Marini erguia a mais nova pelo pescoço com uma só mão. Além de demonstrar uma força maior que a aparente, ela possuía uma aura verde ao redor de seu corpo. Os antigos olhos castanhos de Veroni Marini estavam totalmente brancos e as veias se destacavam com uma cor azulada, na pele que estava pálida. Marceli Marini encravava as unhas no pulso de Veroni, tentando soltar-se. Seu rosto estava vermelho, e sua respiração bloqueada. Pedras e pedaços de gramíneas flutuavam num redemoinho ao redor de Veroni. Do lado oposto a Kendall e Khalil, estava um jovem, amigo de Wallace. O jovem orava devotadamente a todos os deuses, hábito pouco comum em suas atividades diárias. Há alguns galhos[3] no chão, próximo de Veroni, havia um outro corpo. O braço do jovem nocauteado estava visivelmente quebrado. Observando tudo isso, Wallace estava impassível, como uma estátua humana.

— Ve... Veroni... Por... Favor... Não... — suplicou Marceli com um último suspiro.

— Não adianta mortal! — falou Veroni, com um tom gutural na voz. — Sua irmã não está mais aqui! Vai perecer...

— Solte-a!

A voz de Khalil ecoou como um despertador naquele cenário tenebroso. Maxwell, o jovem que orava levantou os olhos, enquanto Veroni voltava seu olhar para os recém-chegados. Kendall fitava Khalil com surpresa, nunca o vira com tanta raiva antes. Apenas Wallace manteve-se imóvel. Veroni, ainda mantendo Marceli no ar, estreitou os olhos e disse:

— Saiam daqui enquanto é tempo! Desobedeçam-me e morrerão também...

— Ora, sua... — bradou Khalil.

— Espera, Khalil. — falou Kendall. — Escute, vamos nos retirar, mas eles vêm conosco...

— São eles que vocês querem? Podem Pegar! — disse Veroni.

Veroni arremessou Marceli em direção aos dois de forma inesperada. Khalil saltou, pegando-a no ar entre os braços. Com o impacto, Khalil caiu no chão, arrastado alguns galhos³ de distância. Veroni estendeu a mão e uma lufada de vento foi atirada contra os dois, levando muitas pedras. Kendall saltou para trás de um tumulo, enquanto Khalil ficou de costas, servindo como escudo de Marceli. As pedras atingiram suas costas, fazendo-o gemer de dor. Quando a lufada de vento cessou, Khalil levantou-se. Precisava chamar a atenção de Veroni para distante de Marceli.

— Agora, você vai ver... — bradou Khalil avançando contra Veroni.

Khalil levou um golpe no estômago antes de chegar a Veroni, com a força do golpe, ele foi arremessado próximo ao muro. O golpe fora muito forte, mas Veroni não fizera nem sequer um gesto, nem um piscar. E isso intrigava Khalil. O que o acertara? Ao abrir os olhos, ele viu Wallace erguer um enorme pedaço de galho em sua direção. Os seus olhos estavam vazios, sem brilho. Ele estava sendo controlado por Veroni, ou o que estivesse possuindo o corpo dela. Com toda a força, Wallace deu o golpe com o galho, mal vendo quando o galho foi parar no chão por trás dele. Além de bloquear, Kendall o desarmara com o seu bastão. Girando rapidamente, ele acertou Wallace jogando-o no chão, próximo a Veroni. Khalil levantou-se com um salto.

— Ela está possuída, Khalil. — murmurou Kendall fitando Veroni nos olhos.

— Eu percebi, irmãozinho. O que vamos fazer? Não temos nenhum clérigo aqui... — perguntou Khalil.

Veroni fitou aqueles dois aventureiros com um certo interesse, suas sobrancelhas arquearam-se ao ver o bastão de Tollon... Sua expressão mudou rapidamente, demonstrando uma face mais humana. Seus lábios murmuraram uma palavra que Kendall e Khalil puderam ler claramente nos lábios dela:

— Fauno...

— Como me conhece, espírito? — bradou Kendall.

— Não importa! — falou Veroni voltando à face furiosa. — Mate os dois!

Wallace ergueu-se e avançou em direção a Kendall e Khalil. Simultaneamente, Veroni criou uma forte lufada de vento que foi em direção aos dois, jogando-os contra o muro. Quando Wallace aproximou-se velozmente e com o punho erguido, Khalil desviou-se do golpe. Um pedaço do muro caiu no chão com o soco desferido pelo rapaz.

— Ele está forte, hein... — falou Khalil, surpreso.

— Cuidado! Lá vem ela! — falou Kendall.

Veroni saltou o muro por cima dos dois, se embrenhando entre as árvores. Kendall olhou surpreso para Khalil, que desviando-se dos golpes de Wallace, disse:

— Vai atrás dela, irmãozinho! Eu cuido desse capanga aqui!

— Pode deixar! Que Allihanna esteja com você! — falou Kendall.

Khalil desviou-se de um outro golpe, dando um salto mortal para trás. Wallace continuou avançando, desferindo rápidos golpes contra o ágil Khalil que continuava a se esquivar. Aproveitando a deixa, Kendall saiu do cemitério atravessando os portões. A situação se mostrara para ele pior do que o esperado, o espírito tinha possuído o corpo de Veroni, a quem jurara proteger. E no momento ele não tinha nem idéia de como fazê-lo. Mas, primeiramente, deveria encontra-la. Após sair do cemitério Kendall fitou a floresta à sua frente, não havia nenhum sinal de Veroni ou algum rastro que indicasse o rumo que tomara. Um calafrio percorreu o corpo de Kendall, quando instintivamente ele soube para onde se dirigir. Respirando fundo, pôs-se a correr em direção às ruínas do castelo de Seppet...

No cemitério, utilizando-se da agilidade adquirida no treinamento da luta khubariana, Khalil esquivava-se dos golpes desferidos por Wallace. Pedaços de lápides e estátuas voavam ao chão, com cada soco desferido por Wallace e esquivado por Khalil. Khalil levava Wallace até os fundos do cemitério, para que nada de mal ocorresse a Marceli. Ele nunca iria se perdoar caso algo acontecesse a ela. Ele não podia permitir. E só em pensar que a culpa fora toda de Wallace que a trouxera ao cemitério, seu sangue fervia. Um soco acertou-lhe o ombro e o impacto o jogou para trás, alguns passos. Girando sobre si mesmo, utilizando a força que fora jogado para trás, ele golpeou o queixo de Wallace com as pernas fazendo um arco no ar. Sentiu seu pé direito doer como se tivesse golpeado uma rocha. Quando pôs o pé no chão, ele pôde sentir que seu pé estava quebrado.

Chegando ao topo do morro, Kendall fitou as negras ruínas. Não havia como não fazê-lo, mesmo cheio de vontade de entrar lá e coragem, seu corpo parecia hesitar. O que antes era um castelo, agora estava aos pedaços, apenas com algumas partes em pé, ainda. Nem mesmo trepadeiras e outras plantas cresceram nas ruínas daquele castelo com o passar do tempo. As paredes das ruínas eram negras, como se tivessem sido queimadas no plano de Thyatis. E, mesmo assim, erguia-se majestosa, no topo daquele morro, impondo respeito, impondo medo. Um brilho no final do morro, mais a noroeste chamou a atenção de Kendall. Um brilho rápido, fusco e verde entre as folhagens das árvores, vindo provavelmente do chão. Deveria ter sido Veroni... Sem pensar duas vezes, e até sentindo um certo alívio, Kendall desceu o morro, correndo entre as árvores.

Khalil fitou novamente Wallace, já não conseguia mais por o pé no chão, depois de ter tentado golpear tantas vezes a Wallace. Seu pé latejava de dor e um corte se abrira em seu tornozelo... Ia precisar de uma boa clériga de Lena quando saísse dali. Ou melhor, se saísse... Pensando nisso, Khalil fitou novamente Wallace, cujo rosto mostrava-se impassível. Um rosto vazio, sem nenhuma expressão facial. Estava sendo controlado, era óbvio... Era tão vítima quanto Veroni ou Marceli. E Khalil estaria muito preocupado com as seqüelas desse combate, em Wallace, caso a pele do adversário não estivesse tão dura quanto uma rocha. Ele tinha que pensar em algo inteligente e que pudesse ser eficaz contra Wallace, sem ferir a nenhum dos dois preferivelmente. E tinha que ser rápido, ele estava se cansando, enquanto Wallace parecia estar apenas se aquecendo. Tinha um certo receio em sua alma, ao ver aquela figura movendo-se de forma tranqüila, em direção a ele. Enquanto recuava, Khalil esbarrou numa lápide, que o fez olhar para trás. Seu rosto iluminou-se de forma indescritível, ele já sabia o que fazer. Pegou uma pedra de pura rocha e atirou em Wallace.

Kendall chegava a escorregar levemente, enquanto corria entre as árvores, morro abaixo. Correra rápido, chegando em um curto período de tempo no local onde acreditara que havia visto o brilho. Era uma entrada de um pequeno corredor no subsolo, uma pequena, mas profunda, caverna. Embora não tivesse a menor intenção de fazê-lo, Kendall parou para respirar um pouco. Estava bastante ofegante. As ruínas daquele castelo causavam uma sensação difícil de controlar e Kendall só a controlara enquanto acreditava que Veroni lá estava, mas após mudar sua crença, não pôde mais conter-se e afastou-se das ruínas o mais rápido que podia. Ela causava pânico, um pânico sobrenatural. Antes que pudesse controlar novamente a respiração, ele ouviu um ruído crescente vindo do túnel. Uma luz verde estava vindo rapidamente na direção dele, era Veroni.

Wallace nem sequer bloqueou o ataque, tendo sua testa cortada levemente pela pedra. Ao ver Wallace aproximando-se, Khalil recuou mais um pouco. Wallace não reagira como ele previra, não enfurecendo-se e nem avançando nele com toda Fúria. Tinha que usar outro plano, então recuou mais um pouco e esperou Wallace aproximar-se. Tinha que ser mais rápido e preciso que o habitual, estava com o pé direito quebrado e só teria uma oportunidade, sem precisar sacrificar-se. Caso falhasse, teria que arriscar com os dados de Nimb... Quando Wallace estava a poucos passos, avançou em Khalil, tentando desferir um soco.

Kendall nem pôde puxar o bastão de Tollon, pois Veroni saíra rapidamente do fosso. Trazia um embrulho negro em seu braço esquerdo. Ela fitou o ranger, surpresa e deixou escapar:

— Fauno?!

— Como sabe... — Kendall tentou perguntar, sendo interrompido pela visão de uma onda de fogo vindo do túnel.

— Idiota! — Veroni se atirou contra ele.

Uma grande explosão saiu de dentro do túnel, indo em direção a Kendall e Veroni.

Agindo com mais velocidade do que o normal, Khalil esquivou-se, indo para a direita de Wallace, onde, agachado no chão, girou, apoiado com a perna boa e golpeou a dobra dos joelhos de Wallace com a perna direita. Mesmo com aquele corpo invulnerável, o impacto flexionou o joelho de Wallace fazendo-o perder o equilíbrio e cair em uma cova com cerca de 3 galhos[3] de altura. Respirando mais aliviado, Khalil sentou-se e contemplou sua obra. Prendera Wallace, agora só tinha que descobrir como dissipar o feitiço que o dominava. Um grande estrondo foi ouvido, seguido de um leve tremor de terra que quase levou Khalil para dentro do fosso. Ele olhou para as ruínas do castelo de Seppet, enquanto em sua alma apenas esperava que estivesse tudo bem com seu amigo e Veroni. O pensamento em Veroni o lembrou Marceli, saltitando num pé só, ele dirigiu-se em direção à entrada do cemitério.

Kendall levantou-se confuso, sentia sua cabeça latejar levemente. Ainda um pouco desnorteado, as lembranças demoravam a retornar à sua mente... Sua visão começava a voltar ao normal, permitindo-lhe visualizar o Lago Analee, existente ao norte de Kizna, após Arbóreas e a oeste de Seppet. Acreditava estar do lado da margem perto das Montanhas Kenoras, pois não podia vê-las à sua frente, o que só era possível na margem norte, de costas pra elas e de frente pro lago. Mas uma pergunta latejava-lhe a mente: O quê ele estava fazendo ali? Com sua mente trabalhando, sua memória começou a retornar e ele lembrou-se do que acontecera e da explosão. A explosão o jogara tão longe, assim? E por que ele não estava queimado? Ao olhar para a direita viu Veroni, com a aura verde menor e parada, olhando para o lago. Ela estava ficando mais parecida com a Veroni normal, o que indicava que o espírito estava partindo. Ele levantou-se. Fitando o lago, Veroni falou:

— Eu havia me esquecido da beleza desse local. — a voz era amena e Veroni sorria levemente. Kendall apenas observava. — Não há florestas de onde venho, nem natureza. Essa paisagem me traz muitas lembranças... Mas isso não importa mais, já fiz o que vim fazer aqui nessa terra. É chegada a hora de partir...

— Quem é você? — perguntou Kendall, arriscando-se. — E o que fez?

— Se acreditar nos deuses, mortal. — Veroni fitou Kendall, estava séria novamente. — Reze. Reze para que nunca venha a descobrir as respostas de tais perguntas. Porque será um sinal de que o domínio de Marah estará ameaçado em Kizna. — Veroni voltou a olhar para as estrelas refletidas no lago. — Não se preocupe. Nada vai acontecer à sua amiga... Quando eu deixar esse corpo, ela acordará como se tivesse apenas caído em um sono profundo. Não vai lembrar-se do houve, muito menos do que fiz. — Veroni olhou para as mãos, sujas de terra e sangue. — É hora de partir. Adeus, Fauno. Ou no pior dos casos... Até breve.

— Espere! Como sabe meu nome? — Kendall indagou.

Veroni respirou fundo e fechou os olhos. Um vento gélido agitou as folhas das árvores próximas ao lago, causando um calafrio em Kendall. Ao cessar, cinco ampulhetas de bronze[4] após surgir, Veroni caiu na areia. Kendall correu até Veroni, tirando o seu rosto da areia e colocando no seu colo enquanto analisava o Ritmo de Lena[5] no pescoço de Veroni. Estava normal, o Ritmo de Lena[5]. As veias azuladas tinham voltado ao normal, não aparecendo mais na pele dela e a aura verde sumira por completo. Estava mais que óbvio que o espírito partira do corpo da jovem Veroni Marini. Sua temperatura e cor tinham voltado ao tom normal. Ela tinha as roupas sujas de muita terra e sangue e parecia apenas dormir. Olhando para o delicado rosto da adormecida Veroni, ele sorriu. Ela estava sã e salva. Fitando o rosto da jovem, Kendall acariciou os cabelos dela. Estava feliz, pois Marah fizera morada em seu coração6. Um coelho saindo da floresta chamou a atenção de Kendall, despertando-o de seus devaneios. Erguendo Veroni nos braços, Kendall começou a caminhar em direção a Kizna.

O coelho o despertara também para as dúvidas criadas por aquela noite. Muitas dúvidas, que aumentavam o imenso mistério que envolvia Kizna e Seppet. Seppet... Esse nome o lembrou das ruínas, para as qual voltou o olhar. O castelo estava lá, imponente, negro, destacando-se na aurora que surgia no céu. Sentiu um pressentimento, seguido do eco em alto e em bom som das palavras do espírito, em sua mente... “Se acreditar nos deuses, mortal, reze. Reze para que nunca venha a descobrir as respostas de tais perguntas. Porque será um sinal de que o domínio de Marah estará ameaçado em Kizna... Adeus, Fauno. Ou no pior dos casos... Até breve”. Olhando para o sereno rosto de Veroni, enquanto voltava a caminhar, Kendall murmurou para si mesmo:

— E farei o possível para impedir que tenha sido um até breve...


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